Ivens entre amigos
Amigos do poeta e escritor Ivens Cuiabano Scaff programam encontro para celebrar o seu legado, ao completar o primeiro ano do seu passamento
O Teatro do Sesc Arsenal receberá, na sexta-feira, dia 21 de fevereiro, amigos do poeta e escritor Ivens Cuiabano Scaff, que fez a passagem há um ano, em 2024, e deixou sua presença marcante… e como legado, uma extensa obra, traduzida em livros de poesia, contos infantis, romance, textos para teatro e muitos outros textos e rabiscos… inéditos e publicados.
A ideia da reunião partiu do amigo de longa data, Jaime Okamura. “Nos idos de 1980, no saudoso Passatempo Bar, tivemos a ideia de apresentar um show inesquecível, que chamamos de “Entre Amigos”, com Ivens e Vera Capilé. Música & Poesia lotaram o Bar nas suas apresentações. Sucesso de público e crítica que marcou uma época”, lembra-se Jaime, saudoso do tempo desse seu primeiro empreendimento.
“Fiz a direção desse espetáculo que levou o seu título ao pé da letra: Entre amigos”, conta Glória Albues, cineasta. “Ao final, todos juntos – palco e plateia – celebramos a arte dionisíaca do canto e da poesia, temperada com muito gosto pelo humor inconfundível do poeta. Por onde andará, Ivens Scaff? Fico sempre a me perguntar. Como todos os grandes poetas, acho que o céu não é o seu limite. Habitará, com certeza, outros infinitos”, pergunta e responde, ao mesmo tempo, Albues.
“Ivens trazia poesia nas nossas conversas! Me incentivou a compor! Fazíamos do palco a varanda de casa! Poetamos muito!”, conta Vera Capilé, amiga de longa data, que completa: “Você já ouviu gargalhada mais gostosa? Inconfundível! Ivens se expressava com muita espontaneidade!”.
Roberto Kazan, médico, conheceu Ivens na Santa Casa de Misericórdia de Cuiabá, em janeiro de 1990, e logo se encantou com “a sua magnitude como ser humano e profissional”. Kazan só tem elogios para a atuação do colega como professor, perceptor e médico num momento em que ainda havia muito desconhecimento e preconceito em relação aos portadores de HIV. “Como professor, ele foi um grande exemplo. Ele entendia que a empatia pelo outro deveria ser imbuída em seus alunos. Sua grande lição era ter empatia pelo paciente e alguns casos o tocavam demais”, completa Kazan.
No encontro será apresentado o documentário “Ivens Cuiabano Scaff: o poeta bem-comportado”, com direção de João Manteufel e produção de Keiko Okamura, por Donalola Produção Criativa pelo projeto Biografias. O doc apresenta aspectos da vida, fala sobre suas obras e as influências do poeta, escritor, verseiro e médico cuiabano. Outros depoimentos sobre o homenageado, gravados pela TV Assembleia, sob a direção do jornalista Cláudio Oliveira.
“Algumas pessoas marcam tão profundamente nossas vidas que, independente da sua presença física, estarão conosco para sempre. Ivens ocupa esse lugar na minha vida e na de centenas de amigos”, destaca Maria Teresa Carrión Carracedo, editora, que desde a década de 1980 acompanha Ivens em suas “deliciosas, inesquecíveis e inusitadas aventuras literárias”.
Os amigos de Ivens se reúnem para compartilhar a saudade, agradecer e celebrar o legado do grande poeta-médico-amigo, médico-amigo-poeta ou amigo-poeta-médico…
Ivens, a alma de Cuiabá
Ivens Cuiabano Scaff nasceu em Cuiabá, em 30 de setembro de 1951. Filho de Hid Alfredo Scaff e Lucina Cuiabano Scaff, personalidades de destaque na história e sociedade mato-grossense. Formou-se pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (1974), tendo exercido a atividade de médico e professor universitário na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e Universidade de Cuiabá (Unic). Ocupou a cadeira nº 7 da Academia Mato-Grossense de Letras.
Além de toda sua atividade como homem de Letras, Ivens foi pioneiro no tratamento da Aids, tendo enfrentado a doença e cuidado dos pacientes desde as suas primeiras ocorrências. Como médico infectologista, foi professor de muitos médicos que hoje atuam em todo o Estado de Mato Grosso.
Nas atividades culturais, foi coordenador de Cultura da UFMT, conselheiro de Cultura da então Secretaria de Estado de Cultura de Mato Grosso, coordenador do Comitê Educativo da Unimed Cuiabá, conselheiro editorial da revista Vôte, colaborador da publicação Estação Bispo.
Teve as seguintes premiações: Prêmio Esso de literatura para Universitários (classificados), Prêmio Jornal do Dia de Crônicas Carnavalescas, Prêmio da Secretária de Estado de Cultura com o livro “Uma maneira simples de voar”. Recebeu condecoração da Ordem do Mérito do Governo do Estado de Mato Grosso no grau Cavaleiro.
Obras publicadas pela Entrelinhas Editora:
— “Fragmentos da alma mato-grossense”, antologia (2003);
— “Uma maneira simples de voar”, ilustrada por Marcelo Velasco (2006);
— “O menino órfão e o menino rei”, ilustrado por Carlão dos Bonecos, Helton Bastos e Marcelo Velasco (2008);
— “Kyvaverá”, ilustrado por Jonas Barros (2011);
— “A mamãe das cavernas e a mamãe loba”, ilustrado por Marcelo Velasco (2012);
— “Asas de Ícaro: versos de enamoramento e seus antônimos” ilustrado por Adir Sodré (2015);
— “Embaúba: a história de uma árvore”, ilustrado por Ruth Albernaz (2020);
— “Haluares: 101 haikais & outros versos luares”, ilustrado por Ruth Albernaz (2021).
— “Além Tordesilhas”, romance juvenil em forma de trilogia (2024).
Publicou também: “Mil mangueiras”, edição do autor (1988); “Mamãe sonhei que era um menino de rua” (1996), “A fábula do quase frito” (1997) e “O papagaio besteirento e a velha cabulosa (1999), os três ilustrados por Wander Antunes e publicados pela editora Tempo Presente.
Entre os livros inéditos, sobre os quais trabalhou incansavelmente nos últimos anos, durante a após a pandemia, estão no prelo, na Entrelinhas: “O menino chorão e o morro que era vulcão”, ilustrado por Gervane de Paula; “Assim também já é demais”, ilustrado por Zeilton Matos; “Ágata, a gata”, ilustrado por Wender Carlos; “O sumiço dos jacarezinhos”, em fase de ilustração por Marcelo Velasco. Deixou ainda muitos livros de poesia, contos e infantis ainda inéditos.
Declaração de Ivens sobre os seus dois grandes amores,
no livro “Uma maneira simples de voar”
Entre dois amores
Tenho amor por uma rainha
e tento ser o seu peão
Nem sempre sendo capaz
É a ela que amo
Atento no calor dos dias
Sou dessa maneira feliz
Felicidade nervosa e sem paz
Mas quando vem a bruma
Amo uma sacerdotisa
Com angústia e alegria
É sim possível!
Cumprindo seus mistérios e rituais
Ciumentíssimas as duas
Fingem que não se conhecem
Nem se reconhecem rivais
Fiel eu sou
Não sei se loucura ou sina
Às duas. À quem mais?
As duas asas com que vôo
O nome da rainha, Medicina
O da maga, Literatura.